As comunidades agroextrativistas de
Portel, na região do arquipélago do Marajó, que há mais de 30 anos travam
batalha contra grileiros de terras e madeiras ilegais que derrubam a floresta
para obter lucro fácil, acabam de ser beneficiadas por um decreto de afetação -
que significa conferir destinação pública a um determinado bem,
caracterizando-o como bem de uso comum do povo ou bem de uso especial, por meio
de lei ou ato administrativo – das glebas Joana Peres II, Jacaré Puru,
Acangatá, Alto Camarapi e Acutipereira, totalizando mais de 500 mil hectares
para fins de ordenamento fundiário e ambiental. Mais de 4 mil famílias que
vivem na região serão beneficiadas pelo decreto, assinado pelo governador Simão
Jatene e publicado no Diário Oficial do Estado do último dia 31.
As terras, segundo o decreto, terão
uso restrito ao manejo florestal comunitário e familiar, caça e pesca de
subsistência, além da agricultura de subsistência em áreas alteradas, com
transição para sistemas agroflorestais e agroecológicos. O Instituto de Terras
do Pará (Iterpa) teve de fazer a arrecadação das áreas devolutas para que o
Estado promovesse a destinação em favor das famílias de agricultores e
pescadores. A próxima etapa do ordenamento fundiário será a elaboração dos
planos de uso dos territórios e cadastramento das famílias pelo Iterpa.
Durante o processo de discussão com
as comunidades de Portel sobre os problemas da região, o diretor geral do
Instituto de Desenvolvimento Florestal do Pará (Ideflor), José Alberto Colares,
reconheceu o débito social e econômico do Estado para com o município. As
lideranças dos moradores sempre enfatizaram que a exploração florestal deveria
ficar nas mãos dos povos tradicionais através da criação de reservas ou outro
mecanismo de regularização fundiária.
O advogado Ismael Moraes, que
defende as comunidades da região, disse que o atual governo, especialmente nas
pessoas de Colares e dos diretores Tiago e Daniel Francez, da equipe do
Ideflor, quita uma “dívida secular do Estado com aquelas comunidades”. Ele
também destaca o trabalho e a persistência do líder comunitário e sindicalista
Francisco Rodrigues de Melo, o “Cametá”. De acordo com Moraes, o governo também
pode a partir daí preparar uma estratégia para debelar pelo menos uma parte dos
efeitos socioambientais da construção de hidrelétrica de Belo Monte.
Ilegal
Entre 2002 e 2007, a extração
ilegal de madeira e palmito no Marajó sacrificou mais de 100 mil árvores por
ano. Os ribeirinhos eram obrigados a vender cada tora de árvore por R$ 8,
colocada na beira do rio. Intermediários entravam rapidamente em ação,
retirando a madeira em balsas e, depois de esquentar a carga em serrarias da
região, negociavam o produto em Belém. Pressionado pela fome e pela miséria, o
ribeirinho submete-se a um esquema perverso de enriquecimento de grupos
empresariais que agem à margem da legalidade, inclusive sonegando impostos.
O novo decreto garante direitos das
populações ribeirinhas, mas ainda precisa de ajustes para que seus efeitos se
façam sentir em Portel. É preciso, por exemplo, exercer fiscalização rigorosa,
com operações periódicas, em áreas onde a derrubada de árvores é feita a
qualquer hora do dia. Trabalho para o Batalhão de Polícia Ambiental, Ibama,
Polícia Militar e Civil, além da Capitania dos Portos. A agricultura familiar
também terá de ser feita em áreas onde já ocorreram extração de madeira, para
que as florestas ainda de pé sejam poupadas.
Fonte: Diário do Pará